A Promotoria de Justiça da Comarca de Bom
Jardim ofereceu, no último dia 17, Denúncia contra a ex-prefeita Lidiane
Leite da Silva; Humberto Dantas dos Santos, o “Beto Rocha”,
ex-secretário de Articulação Política; Antônio Oliveira da Silva, sócio
da empresa Zabar Produções; Karla Maria Rocha Cutrim, sócia da empresa
Zabar Produções; e Fabiano de Carvalho Bezerra, real proprietário da
empresa A4. Eles são acusados de uma série de crimes relativos a fraude
em licitações, desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro.
Na Denúncia, o Ministério Público trata de
dois processos licitatórios e os contratos assinados posteriormente. As
investigações apontam fortes indícios de montagem dos processos
licitatórios e mais uma série de irregularidades. Os empresários
beneficiados teriam, inclusive, ido à prefeitura, acompanhados de Beto
Rocha, pressionar a Comissão Permanente de Licitação (CPL) para que
elaborasse os procedimentos de forma rápida.
A Tomada de Preços n° 01/2013 tinha por
objeto promover a reforma de 13 escolas da rede municipal de ensino e
foi vencida pela empresa Zabar Produções, empresa que, segundo o seu
proprietário, Antônio Oliveira da Silva, faz shows, terraplanagem,
limpeza pública, comércio e reforma de prédios.
A Zabar foi a única
empresa supostamente presente à licitação.
Oficialmente, a licitação teria ocorrido em
abril de 2013, o que contraria o depoimento do presidente da CPL à
época, Antônio Américo de Sousa Neto, que afirma ter presidido a
comissão entre janeiro e maio de 2013, período em que não foi realizada
nenhuma licitação. Segundo ele, os documentos relativos à TP n° 01/2013
foram assinados apenas no ano seguinte, quando Lidiane Leite foi
afastada do cargo. Os documentos teriam sido levados pelo vereador Arão
Sousa da Silva, a mando de Beto Rocha.
Além disso, a Assessoria Técnica da
Procuradoria Geral de Justiça apontou uma série de irregularidades que
indicam a montagem do processo licitatório. Documentos apresentados pela
Zabar Produções, por exemplo, foram produzidos após o suposto horário
da sessão pública de licitação. A ata da sessão, inclusive, não está
assinada pelo licitante e nem pelos demais membros da CPL. Também não
foram assinados o Termo de Homologação, o Instrumento de Contrato e o
parecer jurídico da tomada de preços.
Também não há documento que declare a
existência de recursos financeiros para a contratação nem projeto
básico. “Sem esse projeto, não há como a administração saber se a
proposta apresentada é viável ou se ela está superfaturada”, observa, na
ação, o promotor de justiça Fábio Santos de Oliveira.
Nem mesmo as exigências do edital elaborado
pela própria prefeitura foram atendidas pela Zabar Produções. A empresa
não possuía registro junto ao Conselho Regional de Engenharia e
Agronomia (Crea) e seu patrimônio era insuficiente, visto que era
exigido que a empresa tivesse pelo menos 10% do valor do contrato.
CONTRATO
Em depoimento, Antônio da Silva afirmou que, em três anos e meio de existência, sua empresa ganhou apenas duas licitações, ambas em Bom Jardim. Segundo ele, a empresa tinha duas sedes mas não se lembrava onde ficava uma delas. O empresário também não lembrava quantos empregados a empresa teria.
De acordo com o proprietário da Zabar
Produções, a empresa teria recebido R$ 1 milhão da Prefeitura de Bom
Jardim, dos quais ele teria ficado com R$ 100 mil. O total restante
teria sido repassado a Beto Rocha. As investigações, no entanto,
verificaram que foram transferidos para a conta de Antônio da Silva R$
1.753.591,17 entre os meses de maio de 2013 e 2014, valor superior ao
previsto em contrato.
Cerca de 80% deste valor foi repassado à
empresa menos de quatro meses após a celebração do contrato, quando as
obras sequer haviam sido iniciadas. Posteriormente, a empresa decidiu
que faria as obras em apenas quatro das 13 escolas previstas.
Ressalte-se que, dessas 13 escolas, duas simplesmente não existem no
Município.
“Além disso, apesar de Antônio afirmar
reiteradamente que reformou quatro escolas, ele não tem nenhuma prova do
serviço de engenharia prestado. Ele não apresentou notas fiscais de
aquisição de matéria-prima, nem apresentou contratos de trabalho, nem
recibo de pagamento de débitos previdenciários”, observa Fábio de
Oliveira.
ALUGUEL DE VEÍCULOS
Outro contrato analisado pelo Ministério Público do Maranhão decorre do Pregão Presencial n° 17/2013, com valor aproximado de R$ 2,7 milhões, para aluguel de veículos para a Prefeitura de Bom Jardim. A suposta vencedora foi a empresa A4, que não tinha nenhum veículo registrado e teria sublocado carros e caminhões para servir ao Município.
O suposto sócio da empresa, Anílson Araújo
Rodrigues, afirmou em depoimento que nunca foi empresário e, sim, um
motoboy contratado por Fabiano de Carvalho Bezerra. Ele também garantiu
que nunca esteve em Bom Jardim e que teria assinado a ata da sessão
pública de licitação em outro local e momento. Anílson Rodrigues também
afirmou desconhecer assinaturas tidas como suas em diversos documentos.
O próprio Fabiano Bezerra confirmou pagar
R$ 3 mil mensais para que os dois supostos proprietários da empresa A4
atuassem como “laranjas”.
O Ministério Público solicitou, por
diversas vezes, cópias dos contratos de sublocação, não tendo sido
atendido. Só se teve acesso aos documentos após o afastamento de Lidiane
Leite, quando a ex-vereadora Sandra Regina teria encontrado-os na sede
da prefeitura. Os certificados de registro dos veículos estavam
acompanhados de uma tabela com nomes, endereços, placas de veículos e
outras informações.
Essas pessoas foram ouvidas pelo Ministério
Público e alguns afirmaram sequer possuir um carro, enquanto outros
fizeram contratos verbais com Beto Rocha para disponibilização de seus
veículos. Vários deles também afirmam nunca ter prestado qualquer
serviço ao Município, embora recebessem valores, peças de carro ou mesmo
tivessem empregos na administração municipal.
Chama a atenção o caso de uma cunhada de
Antônio da Silva, proprietário da Zabar, que teria 18 contratos de
sublocação de veículos pesados, totalizando quase R$ 200 mil mensais. Em
depoimento ela afirmou não trabalhar com aluguel de veículos e que a
sua única renda seria o salário de professora, de R$ 724.
O Pregão Presencial n° 17/2013 também
passou pela análise da Assessoria Técnica da Procuradoria Geral de
Justiça, que apontou irregularidades como a ausência de justificativa
para a contratação, falta de cotação de preços e parecer jurídico, que
deveria anteceder o edital, datado de quatro dias depois de seu
lançamento. Também não há termo de adjudicação da licitação e falta uma
série de documentos exigidos da empresa.
Outro detalhe é que a solicitação de
dotação orçamentária tratava da aquisição de gás de cozinha. “Isso
demonstra a falta de cuidado na falsificação dos documentos necessários
para tentar dar aparência de legalidade ao certame”, afirma o promotor
Fábio de Oliveira.
De acordo com o membro do Ministério
Público, “se observa nos comprovantes de transferências bancárias que a
maior parte dos recursos usados para pagar a A4 e a Zabar vieram de
fundos da educação, que nem poderia ser usados para fins diversos do
costeio de pagamento de pessoal da educação”.
CRIMES
Na Denúncia, o promotor Fábio Santos de Oliveira elenca crimes cometidos por todos os envolvidos e aqueles específicos de cada um. Todos os envolvidos foram denunciados por constituir uma organização criminosa, com pena de reclusão de três a oito anos mais multa. Todos também foram enquadrados no crime de lavagem de dinheiro (reclusão de três a dez anos, mais multa) e em sete crimes previstos na Lei de Licitações, cujas penas podem chegar a 27 anos de detenção, além de multa.
Os cinco envolvidos foram denunciados,
ainda, por crimes de falsidade ideológica (reclusão de um a cinco anos
além de multa) e peculato (reclusão de dois a doze anos mais multa).
Antônio Oliveira da Silva também foi
denunciado por corrupção ativa, cuja pena é de reclusão de dois a 12
anos, mais multa. Já Humberto Dantas dos Santos, o Beto Rocha,
responderá por usurpação de função pública, visto que exercia de fato o
cargo de prefeito de Bom Jardim, sendo inclusive responsável pelos
pagamentos realizados pela administração municipal. A pena neste caso, é
de reclusão de dois a cinco anos, além de multa.
Já Lidiane Leite da Silva responde pela
“recusa, o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à
propositura de ação civil pública, quando requisitados pelo Ministério
Público”, com pena de reclusão de um a três anos mais multa; extravio,
sonegação ou inutilização de livro ou documento (reclusão de um a quatro
anos); e desacato (detenção de seis meses a dois anos ou multa).
Redação: Rodrigo Freitas (CCOM-MPMA)
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